segunda-feira, 11 de julho de 2016

O jornalismo é a âncora que separa a verdade do boato





ENTREVISTA: Rosental Calmon Alves

ESTADÃO CADERNO DE ECONOMIA 10/7/2016

‘O jornalismo é a âncora que separa a verdade do boato’

Para especialista, atividade se torna ainda mais importante na era da ‘hiperabundância de informação’
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Claudia Tozetto
09 Julho 2016 | 20h05




Depois de 27 anos como jornalista profissional, sendo 23 deles no Jornal do Brasil, Alves se mudou para Austin, no Texas, para iniciar sua carreira acadêmica nos EUA. Desde 2002, ele dirige o Knight Center for Journalism in the Americas, que oferece cursos pela internet para jornalistas em mais de 160 países.


Foto: Divulgação
'O jornalismo precisa estar onde as pessoas estão', diz Alves
Como o jornalismo online evoluiu nos últimos anos?
Sempre comparo o ecossistema midiático com o biológico. Durante anos, eu dizia que o ambiente midiático evoluiria de um ecossistema baseado na escassez para um ecossistema de uma floresta úmida, baseado na abundância. Isso já aconteceu: a revolução digital foi um dilúvio e os meios de comunicação estão evoluindo para se adaptar. Nós já temos um ecossistema midiático muito diferente de antes e as empresas tradicionais já deram e continuam dando muitos passos para se modificar.
Como o sr. vê o impacto das redes sociais no jornalismo?
A essa altura do campeonato, nenhum veículo de comunicação que se preze pode se dar ao luxo de ignorar ou menosprezar o fenômeno das redes sociais. Além disso, não se pode pensar nas redes sociais como um mero gerador de tráfego para os sites. Para o bem ou para o mal, está acontecendo uma concentração forte nas redes sociais, em especial no Facebook, e há vários fatores técnicos que justificam isso.
Quais são eles?
Existe atualmente um problema tecnológico na web. O Facebook se tornou tão rápido, que raramente um usuário que está navegando na rede social vai querer esperar mais do que três segundos para abrir uma notícia. Se não abrir, uma alta porcentagem desses usuários simplesmente desiste de acessar o site. Isso mostra que há uma barreira enorme entre a estrutura que o Facebook desenvolveu e a paralisia em que a web aberta se encontra.
Quais os reflexos disso para os veículos de comunicação?
O jornalismo precisa estar onde as pessoas estão. E os jornalistas precisam entender que não podem esperar que as pessoas venham até eles, uma lógica que imperou durante anos. Esse ecossistema novo é muito mais proativo. Se está todo mundo nas redes sociais, os veículos também tem que estar lá. Toda a organização jornalística que se preze tem uma operação séria nas redes sociais. Não é brincadeira de criança, como as pessoas pensavam. Isso passou.
Com a diversidade de plataformas e a quantidade cada vez maior de informações circulando nas redes sociais, qual deve ser o novo papel do jornalista?
A importância do jornalismo nesse ambiente de hiperabundância de informação é ainda maior. Você precisa do jornalista e dos meios de comunicação com credibilidade e princípios éticos. O jornalismo é uma espécie de âncora que separa o que é verdade do que é boato.
Como você vê o aumento da disseminação de notícias falsas nas redes sociais?
As pessoas estão passando por um período meio caótico de acreditar em bobagens. É incrível o número de pessoas em nosso círculo de amizades que acreditam em coisas absolutamente inverossímeis e as espalham num ato de irresponsabilidade. Mas as pessoas estão começando a se dar conta do perigo que são as notícias falsas. E muitos jornalistas e organizações jornalísticas estão desenvolvendo técnicas para desmentir boatos. Antes, havia uma hesitação dos jornais em desmentir notícias falsas, porque, ao fazer isso, poderiam espalhar ainda mais as dúvidas. Acho que estamos perdendo esse receio. Quando encontramos um boato na internet, os jornalistas têm de ser proativos e desmenti-lo.
Como o jornalismo de qualidade ajuda a mitigar esse perigo?
Nesse ambiente, o jornalismo de qualidade – baseado nos princípios éticos, na metodologia de apuração, na disciplina de verificação – só tem a ganhar. Uma boa parte das pessoas, quando está diante de uma notícia falsa, vai procurar um veículo de comunicação de credibilidade para verificar se é verdade ou não. Uma boa maneira de checar um boato, é ver se o Estadão ou outros veículos publicaram a notícia.
O que podemos esperar para o futuro do jornalismo?
É difícil prever, mas eu acho que o jornalismo vai continuar sendo um dos principais pilares de uma sociedade democrática, livre e aberta. O problema é como esse jornalismo vai se pagar, ou seja, como vamos criar modelos de negócio que possam financiar a existência desse profissional. Teremos sucesso garantido na medida em que continuamos a ser úteis. Como estamos numa era de hiperabundância de informação, é preciso acompanhar as mudanças de hábito e ir aonde as pessoas estão. Não interessa a plataforma: o importante é que o jornalismo exerça um papel relevante na vida das pessoas. 


sábado, 2 de julho de 2016

Gestão de marca em tempo de crise

Estadão  - 30/06/2016

Por Elizete de Azevedo Kreutz


Se a marca é uma representação simbólica multissensorial, ela jamais deve deixar de relacionar-se com os seus públicos, mesmo em épocas de instabilidade
O cenário das marcas muda constantemente em função dos avanços tecnológicos, das crises ou bonanças econômicas, acontecimentos sociais, entre outros. Esses fatos modificam o contexto e, como consequência, o comportamento dos públicos, que são a razão de existir de uma marca. As marcas são formas simbólicas que interagem com seus públicos para conquistá-los. Essa interação pode variar de intensidade de acordo com o posicionamento da marca, as características dos públicos e da sociedade em que está inserida, bem como os meios técnicos de produção e transmissão das mensagens.
Uma marca poderá evocar lembranças e provocar a emoção, mantendo uma relação mais afetiva e duradoura com seu público, permitindo que este tenha um vínculo sentimental com ela, identificando-se com ela. Porém, isso só será possível se o seu discurso for construído de forma coerente, pois a marca é a representação percebida e fixada na mente dos públicos, por meio de suas experiências com ela, que combinadas de forma holística constroem a sua imagem-conceito.
Saber o que é mais valioso para a sociedade e para os públicos é fundamental para as ações da marca, e essas informações são obtidas por meio das pesquisas (brand research). Contudo, quando uma pesquisa detectar valores que não fazem parte da essência/posicionamento da marca, esta não poderá fazer uso em suas estratégias, posto que não seria verdadeiro nem ético. Um exemplo: a marca verde (green brand). Muitas marcas usaram esse apelo apenas como maquiagem (greenwash), mas não convencerão os públicos por muito tempo e, no final, o que era para ser positivo para marca, torna-se negativo, perdendo a confiança do público. O mesmo vale para as marcas que se dizem sustentáveis, comprometidas, responsáveis... Não basta dizer, é preciso fazer para que as pessoas acreditem de fato. E a esse conjunto de atos sociais chamamos de Discurso Multimodal da Marca. Em todos seus pontos de contato com seus públicos, da identidade visual ao telefonema, a marca deverá atuar com coerência.
Isso não significa que ela deverá ser sempre igual, fixa, rígida. Ao contrário, pois se assim for, perderá o interesse de seus públicos, que estão cada vez mais ávidos pelo novo, pela interação com a marca. Um bom exemplo disso é a estratégia das Marcas Mutantes, que é uma prática contemporânea e que tem sido usada por diversas empresas. A proposta é fazer uso da multimodalidade, buscando experiências multissensoriais, pois a emoção é o vínculo com seus públicos, e vice-versa, e sua imagem-conceito será construída por seu discurso multimodal coerente, que tem como base o imaginário coletivo.
Se a marca é uma representação simbólica multissensorial, cujos significados são construídos socialmente por meio de seu discurso multimodal, ela jamais deve deixar de relacionar-se com os seus públicos, ainda que em épocas de crise. Se a marca é uma representação simbólica multissensorial, cujos significados são construídos socialmente por meio de seu discurso multimodal, ela jamais deve deixar de relacionar-se com os seus públicos, ainda que em épocas de crise.