domingo, 29 de junho de 2014

Na falta da bola

Por Veríssimo - "O Globo" - 29/06/2014
 
É conhecida a história daquele editor de jornal que se lembrou em cima da hora que no dia seguinte era Páscoa, e o jornal precisava se referir à data. Entrou na redação e pediu a um repórter:
— Escreve aí cinco linhas sobre o martírio de Jesus Cristo.
E o repórter:
— A favor ou contra?
Também faz parte do folclore jornalístico a matéria feita antes do fato, que vale para qualquer eventualidade. Considerações sobre o nada, à prova de desmentido. Outro recurso do jornalista na sua eterna luta com os prazos de fechamento do jornal é fazer duas matérias, uma prevendo uma coisa e outra prevendo o seu oposto. Este é perigoso, pois há sempre o risco de haver confusão e sair a matéria errada. No caso do futebol, a matéria dupla feita antes de se conhecer o resultado do jogo — por que ganhamos, por que perdemos — requer uma dose ainda maior de sangue-frio.
A verdade é que, entre todos os avanços tecnológicos disponíveis hoje para jornalistas e palpiteiros, ainda não inventaram o que realmente precisamos. Lembro a sensação que foi, entre nós, subdesenvolvidos, a aparição de jornalistas europeus com computadores portáteis, ainda primitivos, mas já anos na frente das nossos humildes blocos de notas e canetas, na Copa do México, em 86. Transcrevíamos nossas notas com máquinas de escrever pre-históricas e depois picotávamos nossas matérias em fitas de Telex, para transmiti-las. Hoje temos tudo na palma da mão e na ponta dos dedos — celulares, tabletes, satélites e etcéteras eletrônicos para transmissões instantânea —, mas ainda não temos bolas de cristal. Nada mais antigo, do tempo de magos e feiticeiras, do que bolas onde se enxerga o futuro. Mas falta a versão para jornalistas. Assim não dá.
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Confissão: o texto acima foi escrito antes do jogo. Agora eu sei qual foi o resultado.
E cada vez me convenço mais que decisão nos pênaltis deveria ser proibida pela Convenção de Genebra. Quanto ao jogo, minha analise abalizada é a seguinte: UFA!
 

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